quinta-feira, 28 de abril de 2011

Vontade Divina

Vontade Divina
                                                                       João Fidélis de Campos Filho
        Foram brevíssimos minutos. O repórter aproximou-se do moço que aparentava vinte e poucos anos. “Foi por Deus”, explicou ele ao repórter, ainda sob o impacto do medo e da emoção. O repórter perguntou: como aconteceu?
E ele relatou o episódio: “Eu e meu irmão brincamos de bola quase todo dia neste campinho, depois do trabalho. Ontem quando começamos a trocar bola o tempo mudou de repente. Ouvi um grande estrondo e em seguida um raio atingiu em cheio meu irmão. Quando chegou ao hospital já estava morto. Graças a Deus não fui atingido, senão teria partido desta também”, explicou o rapaz.
Este fato ocorreu há poucos dias. Mas quando da tragédia em Teresópolis um ancião lamentava a perda de toda a sua família arrastada morro abaixo com a tempestade. Ele que foi o único sobrevivente de uma prole numerosa sentenciou: “Deus que me livrou! Só sofri um corte no braço, mas já estou bem.”
Nos dois casos vitimas que perderam entes queridos agradecem a Deus por ter-lhes poupado a vida. O Deus que permite a tragédia e a morte de crianças inocentes é o mesmo que deixa ileso um homem de idade avançada. O Deus que permite que um irmão morra num raio fulminante e, o outro irmão que estava a poucos metros sobreviva, pode ser julgado pela nossa razão interpretativa?  
“Se quiser desafiar o Criador infrinja a lei natural das coisas”, dizia Pascal ciente que o homem tem grande parcela de culpa ao expor-se ao perigo. Mas o que dizer dos inocentes vítimas dos atos inconseqüentes dos outros? Dos civis que são atingidos pelas guerras, dos motoristas que são arrolados em acidentes pelos maus condutores e perecem, dos milhares atingidos por balas perdidas e das crianças ceifadas pelas epidemias, fome e desastres incontáveis?
“Todos tem sua hora de partir”, afirma os espíritas. Tudo obedece à sábia lei do carma, aonde o ciclo das reencarnações vai conduzindo o espírito ao aprendizado e o despertar da consciência. Deus, para quem o tempo não existe exerce seu completo domínio sobre a vida e a morte. Cada molécula que se choca obedece a sua vontade. No entanto o homem indaga, edifica sistemas para explicar suas teorias, mas grande parte dos acontecimentos mundanos está envolto num véu de mistérios.
Para algumas religiões Deus tem um plano para cada ser existente neste planeta e este ser cumpre simplesmente sua obrigação de tempo e espaço. A vida seria para alguns apenas poucos segundos enquanto que para outros longeva. A questão é que o homem, como todos os seres existentes, nasce com um forte instinto de conservação da espécie, não aceita seu destino. E para manter-se afastado das doenças psicológicas apega-se às ilusões e desejos da vida cotidiana.
Compreender o porquê dos acontecimentos deste planeta ou os desígnios divinos como prova Kant é um campo fértil de especulações porque o que está além das leis da natureza não pode ser demonstrado. Não é como somar dois mais dois, que se sabe com certeza que o resultado será sempre quatro. Por isso Deus surgiu sempre na história da humanidade para explicar tudo que o homem desconhecia. A existência de Deus é na filosofia o ponto de partida para o estudo da metafísica e uma pré-condição fundamental para as religiões. Sem Deus elas não teriam razão de existir.
Muitos filósofos preferiram crer numa ordem racional do universo e numa causa desta ordem que seria Deus, mas a maioria não aderiu aos sistemas religiosos erigidos a partir da idéia deste Criador. Diante da incerteza a dúvida ainda é a melhor opção. Mas isto não retira do homem o estímulo contínuo de buscar a verdade, ou estar freqüentemente construindo novas “verdades”. Cada um é um microcosmo e carrega consigo um sistema de crenças. E indagar sempre é sua sina.
João Fidélis de Campos Filho- Cirurgião-Dentista

quinta-feira, 21 de abril de 2011

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Força Modeladora da Natureza

João Fidélis de Campos Filho

O homem moderno se vê diante de muitas situações nas quais é obrigado a fazer escolhas cujos acertos ou erros dependem da avaliação de sua consciência. São muitos os estímulos psicossociais, pois estamos num tempo de grande diversidade material e cultural. A vida tranqüila das gerações de décadas passadas foi substituída pelo ritmo frenético dos acontecimentos que se sucedem e que dão tão pouco tempo ao homem de digeri-los. As frustrações geralmente se originam da natural incapacidade de se realizar todas as aspirações, dos conflitos de relacionamentos e do sentimento de culpa.

Não é por mero fatalismo que muitos filósofos de nossa época redescobriram o pensamento de Demócrito, pois suas idéias funcionam como um antídoto aos males do homem atual, ao mesmo tempo em que combinam com a atmosfera científica e industrial deste século. Este pensador grego percorreu o mundo de sua época em longas viagens até por fim estabelecer-se em Atenas e dedicar seu tempo à contemplação e ao estudo, levando uma vida simples e desprovida das coisas inúteis que os homens comuns costumam julgar “essenciais’

Para Demócrito nossos sentidos são pouco confiáveis e nossas necessidades são guiadas por valores culturais abstratos. ”Se todo o universo é formado de átomos cujas forças estão constantemente interagindo o homem vive apenas das formas com que a matéria se diferencia e de seus efeitos”, ou seja, vive num mundo aparente de causas inacessíveis à sua compreensão. Os átomos e suas reações constituem a verdadeira realidade, afirmava.

Demócrito pregava que a felicidade é algo inconstante e os prazeres sensuais apenas nos oferecem breves satisfações. O ser humano só encontra um contentamento mais duradouro através da paz e serenidade da alma (ataraxia), do bom humor (euthumia) e da moderação (metriotes).

Outro componente da realização pessoal é a chamada “nobreza do homem”, diz o pensador grego. Se os animais cumprem com suas obrigações instintivas (“a aranha a tecer”, as andorinhas a construir, o rouxinol a cantar, etc.,”) a força de caráter é motor que dirige o homem feliz. Por isso Demócrito diz: “As boas ações não devem ser praticadas por obrigação e sim por convicção: não com esperança de recompensa (como erroneamente pregam certas religiões), mas pelo simples amor à bondade”. E arremata: “É mais diante de si próprio do que diante do mundo que o homem deve envergonhar-se de suas más ações”.

Interessante que Demócrito aponta o amor como a maior força modeladora da natureza. Na extremidade oposta o ódio funciona como força desorganizadora. Graças ao amor o homem criou as mais belas obras de arte e tornou a vida mais saudável e com mais bem estar. Segundo Demócrito a evolução e o progresso da humanidade demonstram que o amor prevalece porque o homem não cessa de criar, apesar de todos os conflitos e vicissitudes.

Por não citar Deus em seus escritos e acreditar na ordem natural das coisas, muitos filósofos tendem a pensar que Democrito era ateu. A célebre frase “o todo é algo que jamais foi visto, ouvido ou concebido pelo espírito do homem” é tida como prova de sua incredulidade num governante do universo. No entanto ele nunca se manifestou claramente sobre esta questão. Dizem alguns até que ele era indiferente a isso.

Demócrito viveu 109 anos e muitos de seus amigos construíram sua verdadeira filosofia já que apenas 470 linhas do que escreveu chegou até nós. Contudo seu texto ainda é muito lido e estudado em universidades do mundo todo e é objeto de grandes debates no campo das idéias.

Obs. palavras entre aspas são de Demócrito.

João Fidélis de Campos Filho

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