quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Novos Pecados Capitais

Novos Pecados Capitais
                                                                       João Fidélis de Campos Filho
                                      “O homem feliz é o que não tem passado. O maior dos castigos, para o qual só há pior no inferno é a gente recordar” (Rachel de Queiroz)
       
        Não há dúvida que as pessoas que conseguem livrar-se dos erros, fracassos e decepções da vida pregressa vivem mais, pois abortam uma série de doenças psicossomáticas. Se as doenças têm inicio na mente, aqueles que lidam com mais facilidade com os conflitos internos naturalmente constroem uma blindagem contra a maioria delas. Entretanto os indivíduos que tem facilidade para guardar ressentimentos e possuem um elevado nível de vaidade teoricamente estão mais sujeitos a metabolizar estes sentimentos no futuro através de alguma forma de dor. E esta dor acaba vindo de alguma maneira. Nietzsche afirmava que “a memória do ressentido é uma digestão que não termina”. Quem guarda mágoas de alguém tem sempre uma causa mal resolvida a ser sanada e sua realização é se ver vingado pelos acontecimentos futuros. O maior problema do ressentido é que ele invariavelmente acredita que sua infelicidade presente é culpa de outra pessoa, ou de outras pessoas. E alimenta diariamente este sentimento. Mas o pior tipo de ressentido é o que atribui constantemente aos outros a causa de seus erros. “O inferno são os outros”, diz o ditado. O ressentido não sabe amar e não quer amar, mas quer ser amado. Mais que amado, quer ser alimentado, acariciado, acalentado, saciado. Não amar o ressentido é prova de maldade para ele.

        Mas hoje em dia, tão ruim como a mágoa o sentimento de culpa é visto como o oitavo pecado capital. Desde os primórdios o homem cultiva uma culpa que usualmente ceifa muitas das suas possibilidades de realização como ser porque sacrifica o presente em função de um futuro incerto. Voltando ao filosofo alemão Friedrich Nietsche as religiões empurram o ser humano para niilismo contraditoriamente, pois lhe incutem uma culpa perpetua pelos pecados e o transforma refém de um suposto paraíso ou inferno. Numa brilhante passagem do seu livro “Operação Cavalo de Tróia”, o escritor espanhol J.J Benitez diz: “Na realidade, creio que nenhuma igreja tem futuro, por um motivo: elas são meras etapas na vida dos seres humanos. Por milhares de anos a humanidade adorou o raio, sol, a lua, e isso passou. Agora estamos na etapa do dogma, em que as igrejas oferecem a salvação eterna, mas isso também vai passar. Um dia o homem chegará ao sagrado por si mesmo. Será o lindo experimento da busca pessoal”.
        Já há outros que pensam que o oitavo pecado capital, além da luxúria, gula, avareza, ira, soberba, preguiça e inveja, definidos pelo papa Gregório I, é a idolatria. O homem se acostumou a criar heróis e santos para suprir suas deficiências e, longe do aspecto sadio de enxergá-los apenas como exemplos a serem perseguidos os vêem como seres com poderes sobrenaturais. A sociedade moderna não se desvencilhou ainda dos falsos deuses por isso continua a mitificá-los de maneira errônea e supersticiosa. Aproveitando-se disso surgem falsos pastores a guiá-los nesta direção diariamente. Tornou-se um negocio lucrativo, pois a religiosidade é parte da natureza humana e é fácil despertá-la com promessas vis.
        Há também quem pense que o oitavo pecado capital é a corrupção. E se for verdade é um dos pecados mais praticados na atualidade, porque está inserido na vida pública de todas as nações do planeta em maior ou menor intensidade dependendo do nível cultural da população. O Brasil infelizmente ocupa posição de destaque entre os países mais corruptos e a ascensão a um cargo público quase sempre está associado ao enriquecimento ilícito. Há muitas cidades na Alemanha em que o prefeito e os vereadores recebem salários simbólicos ou nenhum salário, pois é um prestigio para eles servir à comunidade a que pertencem.
        Dizem alguns que a mentira ocupa posição de destaque entre os pecados humanos portanto seria o oitavo pecado esquecido por Gregório I. A mentira está associada à traição e quem se sente enganado pela inverdade propalada por outrem sempre contabiliza dissabores ou prejuízos materiais. A mentira gera a desconfiança e abala a credibilidade das instituições que dela se utilizam para atingir seus fins. Mentir é um vício perigoso e quem se habitua a ele constrói para si um mundo irreal. E passa a viver neste mundo ficcional como principal artífice. Dessa forma a mentira pode ser também considerada como mais um pecado capital.
        Nesta época que se fala tanto em consumismo o individuo perdulário também pode ser considerado mais um pecador? O perdulário causa muitos prejuízos a si, aos que o rodeiam e às vezes aos que nele confiam. Gastar mais do que se tem é como se apropriar do trabalho alheio sendo dessa forma mais um pecado que poderia ser adicionado aos já existentes.
        Pelo exposto a lista de pecados capitais precisa ser atualizada. Poderiam ser incluídos muitos crimes praticados pelo homem contra seu semelhante e que ocupam os inquéritos policias. Não se esquecendo dos modernos crimes cibernéticos, como disseminar vírus e retirar dinheiro de correntistas de bancos. Sendo assim o pecado está mais ligado à escolha (bem ou mal) do que propriamente ao ato. Escolher o mal seria sempre o pecado não importando se seria o oitavo ou o décimo terceiro pecado capital... A propósito a fofoca não é mais um dos pecados capitais?
João Fidelis de Campos Filho- cirurgião-dentista.

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